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adas a indignação e a euforia, Sérgio Cardoso Ayres reflete sobre vandalismo e cultura n353k

Por Sérgio Cardoso Ayres

Membro da Academia Barbacenense de Letras

 

Depois da indignação de muitos e a euforia de um número considerável de pessoas, todos divididos entre punir o que julgam constituir vandalismo o ato de protestar jogando tinta em um bem tombado ou, por outro lado, valorizando aqueles que comemoraram as ‘novas cores’ para a Casa da Cultura, podemos hoje, com a devida isenção temporal e a seriedade necessária, analisar o fato que gerou indignação e euforia, sem se deixar influenciar por cores ou comentários nas redes sociais. Afora manifestos que pouco dizem, opiniões eivadas de juízos de valor que nem sempre valem alguma coisa e justificativas que não convencem a ninguém, temos diante de nós fatos concretos: imóveis históricos públicos e particulares caindo aos pedaços aqui e ali neste país; o poder público dando cabeçadas para justificar a falta de manutenção para a conservação das memórias e das identidades comunitárias; a cultura tratada com romantismo e não como geração de trabalho e renda; uma sociedade que busca culpados para isso e aquilo sem entender que é ela mesma que elege presidentes, deputados, prefeitos e até conselheiros do patrimônio histórico; além da falta de recursos quando se trata de valorização dos saberes e fazeres.

Para os que acusam de vandalismo o ato de jogar tinta em patrimônio tombado, é preciso reconhecer que também podemos considerar como vandalismo deixar imóveis históricos, como a Casa da Cultura, em situação precária. Aliás, de cultura mesmo ela pouco produz, com uma biblioteca defasada, um arquivo sem recursos e instalações sanitárias incipientes. Os outros problemas são visíveis na fachada e no telhado. Se for para punir quem cometeu crime contra o patrimônio público e histórico, temos que penalizar Chico e Francisco com o mesmo castigo: os que jogaram tinta, os acusados de vandalismo, e as istrações estadual e municipal, que deixaram o imóvel nas condições atuais, vandalismo também. Para os que comemoraram as novas cores, fica o exemplo do tipo de protesto que desrespeita as leis que regem o país, ou seja, a Constituição Federal, que vem sendo atacada a torto e a direita – principalmente à direita. Não vejo como desculpar nenhum dos dois: como diz o ditado, o pau que bate em Chico, tem que bater também em Francisco. Punição, sim, para os dois! E é preciso ressaltar, como ilustração, que não existe cor sem a presença da luz. Ou seja, as cores não existem! Na verdade, o que tem faltado neste reduzido universo municipal é luz. Emeric Marcier já dizia que em Barbacena já levaram quase tudo, só falta sumirem com a luminosidade, essa que incide na primavera.

Barbacena sofre com alguns problemas urbanos que se arrastam mais do que a serpente que dizem morar na torre da Boa Morte. A situação do Ginásio Sílvio Raso, do Clube Barbacenense, da Casa da Cultura, do prédio do Hotel e Cine Palace, entre outros, parece não ter solução. Temos também a Estação Ferroviária, cuja revitalização nunca termina. A verdade é que a cidade não consegue soluções para suas demandas e, por conseguinte, muitos acham que ela é um ser morto e que tudo vai continuar como dantes no quartel de Abrantes. Mas, felizmente, esses estão enganados! A cidade, como extensão do ser humano, tem vida própria, está em constante movimento e pede soluções para os seus inúmeros problemas em nome da mobilidade urbana e da qualidade de vida de seus moradores. Jogar tinta ou procurar culpados para o descaso não é solução para quase nada. Seria como um cachorro correndo atrás do próprio rabo sem saber o que vai fazer se alcançar. E pior: nunca alcança! Só serve para punir quem não cumpre a lei. Enquanto a maioria dos municípios gasta muito em festas e shows, como se cultura fosse só isso, como é o caso de Barbacena, o nosso patrimônio material e imaterial, isso para não falar em saneamento básico, sofre com a falta de recursos. E não estou falando só na memória arquitetônica, que nem é a mais importante, mas também nas manifestações populares, a nossa imaterialidade. Só que a comunidade prefere festas com Luan Santana a investimentos em educação patrimonial, recuperação do patrimônio histórico e outros, digamos assim, procedimentos educativos. E não estou mentindo: o povo quer e o governo vai atrás. Afinal, de quem é a voz de Deus?

É conveniente ressaltar que ficar editando decretos de tombamento sem uma política pública de manutenção do patrimônio já constituído, como fazem muitos conselhos, causando prejuízo aos proprietários desses imóveis, não resolve nada. É o mesmo que exigir proteção para a casa do vizinho de valor histórico, mas achar que temos o direito de demolir a nossa de valor histórico – e que pimenta nos olhos dos outros não arde. Proteger a memória e a identidade de um povo, como também protestar com inteligência contra o descaso, é muito mais um ato educacional do que artístico, cultural ou de protesto. Chamamos isso de educação patrimonial. E como faz falta, junto com bom senso!

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