Diretor geral afastado do Hospital Policlínica de Barbacena publica Carta aberta à população de Barbacena e região.
CARTA ABERTA AO POVO DE BARBACENA E REGIÃO
As atividades de promoção da saúde são de cunho social,
visam o bem comum da população e receberam tratamento especial da Constituição Federal.
A obrigação de oferecer saúde ao cidadão é dos Governos Municipal, Estadual e Federal.
Povo de Barbacena e região,
Diante dos fatos ocorridos no dia 8 de janeiro no Hospital Policlínica de Barbacena, alvo de intervenção pela Prefeitura, sentimo-nos no dever moral de vir a público, prestar esclarecimentos e alertá-los sobre o movimento político que está sendo conduzido pelos gestores municipais, com apoio da Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais, já com vistas às eleições de outubro no município.
A Direção do Hospital Policlínica de Barbacena, que assumiu em junho de 2023, vinha fazendo um papel de utilidade pública, levantando temas polêmicos que estavam sendo ocultados pelo governo municipal sobre a saúde da nossa região: equipamentos inativos, deixando de atender usuários que estão morrendo por falta de estrutura, o sucateamento da rede pública de Saúde, a falta de leitos de CTI, razões pelas quais Barbacena é hoje a cidade com a pior avaliação na saúde na região do Campo das Vertentes, que por sua vez, é a região do estado de Minas Gerais com a pior avaliação no quesito Saúde. A pesquisa foi publicada na última semana pelo jornal O Tempo
Em vez de organizar, trabalhar juntos e apoiar aqueles que prestam um serviço de qualidade, optaram os gestores das esferas municipal, regional e estadual, por atribuir a culpa pelo caos da Saúde na região a um pequeno hospital de 70 leitos. Isso pode explicar muitos fatos e, principalmente, o motivo pelo qual o Hospital Policlínica está sendo vítima de retaliação e perseguição política.
A atual Direção do Hospital buscou diálogo com a istração Municipal sobre o contrato vigente, na tentativa de evitar o agravamento do arrocho financeiro do hospital, vivenciado pela maioria das instituições filantrópicas do país, inclusive alguns de nosso município, com a mesma dificuldade de cumprir as metas contratuais, mas que receberam um tratamento diferenciado, mais benéfico, tendo suas dificuldades financeiras sido equacionadas com notável empenho e apoio do Município.
A situação financeira do hospital foi ainda mais fragilizada por conta da retirada de recursos, decorrentes do encerramento de serviços públicos de forma abrupta e das questões dos contratos com a SESAP, baseados em metas quantitativas/qualitativas/financeiras atualmente inalcançáveis pela maioria das instituições de saúde. A Direção do Hospital, por repetidas vezes, comprovadamente, solicitou à Secretaria de Saúde a revisão deste contrato, mas não foi contemplada.
Chegamos ao extremo de, por uma única reclamação de usuário(a), sobre uma cirurgia que, por razões técnicas, alheias à vontade do Hospital, precisou ser adiada de uma semana para outra, a Secretaria de Saúde exigir do Hospital a devolução de R$ 7.727,00. Penalidade nada razoável! Afinal, a referida cirurgia foi logo realizada, com sucesso e os serviços de acolhimento muito bem avaliados pelo paciente atendido e por sua família. Metas como a deste exemplo inviabilizam a execução do serviço, já que esta alta quantia poderia ter sido usada para custear cerca de outras dez ou mais cirurgias para a população carente. E pior, este valor devolvido não foi revertido diretamente para a saúde, pois entra no caixa único da Prefeitura, podendo ser aplicado no que a istração Municipal bem entender, até mesmo para fora da Saúde.
Ao chamar a atenção da população, o Hospital Policlínica de Barbacena pode ter desagradado aos gestores, pois realmente a Saúde Pública não está andando bem, em prejuízo de quem mais necessita. E agora, com esta intervenção/requisição istrativa, agentes do poder público se valem da força de ato normativo de duvidosa legalidade, para se apossarem temporariamente de entidade privada para, sob o duvidoso argumento de “melhorar o atendimento”, colocar em prática intuitos políticos, que am ao largo do interesse geral da população usuária do SUS.
Se a Saúde da população fosse a real preocupação do governo, não haveria razão para deixar os leitos de CTI da Policlínica inativos por exatos 500 dias, completados na véspera da intervenção, enquanto mais de 500 pacientes morreram nas filas de leitos de CTI neste período? Com a mesma agilidade com que o Prefeito trouxe à cidade o Secretário de Estado para anunciar a intervenção de âmbito municipal, poderia ele, sem dificuldades e em nome da vida de quem necessita de atendimento, conseguir que o mesmo Secretário autorizasse a celebração de um Ajustamento de Conduta, para que os leitos fossem reativados, em nome de centena de vidas perdidas!
E mais, por que razão inauguram novas UBS’s mas não oferecem nelas um serviço de qualidade com médicos e enfermeiros? As reclamações dos usuários não mentem. Os recursos enviados pelo Governo Federal chegam ao Município pontualmente, mas a carência de médicos e demais profissionais de saúde, equipamentos e material adequado, são recorrentes nas UBS. Você, cidadão que depende do SUS, quantas vezes foi a uma UBS e não encontrou médico para atendê-lo? Com uso eficiente do dinheiro público, é possível ao poder público conseguir profissionais em quantidade e qualidade necessárias.
E ainda, por que não foram utilizados os mais de 100 MILHÕES DE REAIS das contas do Fundo Municipal de Saúde para zelar, de verdade, pela melhoria da assistência em Saúde? Decerto, prezou mais por garantir popularidade de sua imagem, sobretudo em redes sociais, enquanto outras prioridades inadiáveis vão ficando em segundo plano. Festa para o povo é bom, sem dúvida, mas a cidade precisa ser como a casa da gente: só damos festa quando a casa está arrumada e estão todos com saúde em dia.
No dia 09 de janeiro, o Governo Federal divulgou o balanço nacional das cirurgias eletivas no país. Mais de 350 mil cirurgias eletivas foram realizadas pelo SUS no Brasil. Só o Hospital Policlínica de Barbacena realizou 1.309 cirurgias pelo SUS. No país inteiro, o Governo Federal disponibilizou R$ 600 milhões em 2023, e executou 72% da meta estipulada de cirurgias. Com esse resultado positivo, o orçamento será dobrado em 2024. Já em Barbacena, que possui uma condição totalmente diferenciada pela gestão da SESAP, as metas só prevêem o pagamento integral se ultraar os 95% da meta de realização e desde que não haja reclamações, porque, senão, os estabelecimentos de saúde são obrigados a devolver parte do recurso, até que o Hospital chegue a custear integralmente as cirurgias, e não mais o Município, que é responsável por aplicar as verbas do SUS. E com isso o Hospital vai se endividando, aumentando suas dificuldades, mas a cobrança da Prefeitura não cessa, e a entidade acaba sendo taxada de ineficiente.
Além disso, a ação determinada pelo Sr. Prefeito foi executada com um espetáculo midiático: um aparato de segurança de dezenas de agentes e viaturas, desproporcional e absolutamente desnecessário, na clara intenção de manipular a opinião pública e intimidar a Diretoria e os demais colaboradores do Hospital. Até o momento, há agentes de segurança circulando nas dependências do Hospital, como se a Diretoria os colaboradores que atuavam até o dia 08/01/2024 fossem invadir o local, agredir alguém ou obstruir os trabalhos da Comissão Interventora! Só conseguem, com isso, criar um ambiente pesado, de temor e insegurança, contrária ao que deve ser o ambiente de uma unidade de saúde - local de acolhimento, de luta pela vida, saúde e dignidade humanas.
E desta forma, a istração Municipal vem, há algum tempo, adotando medidas istrativas que sufocaram o nosso Hospital, em quatro principais os:
1) Mudou a forma de pagamento das Órteses e Próteses, efetuando cortes inesperados e provocando a queda drástica da produção do Hospital;
2) Alterou a forma de avaliação dos serviços prestados, sem qualquer diálogo ou interação entre as partes, ocasionando cada vez mais perdas para o hospital;
3) Impôs a contratação de profissionais que ocasionaram diversos problemas para a instituição e para os pacientes (capítulo ao qual iremos nos referir futuramente, e mostraremos como a SESAP colocou interesses políticos acima da qualidade de profissionais para tratar a população);
4) A paralisação do atendimento de porta SUS do hospital, quando encerrou a referência para doenças respiratórias e os atendimentos classificados como “Azul” e “Verde” (de menor gravidade), que foram levados para o Hospital Regional - já sobrecarregado com suas demandas próprias, fazendo com que o hospital deixasse de receber mais de R$150.000,00 por mês. Este recurso era imprescindível para custear a contratação de médico 24 horas por dia, para e aos pacientes internados, custo que ou a ser ado também pela Fundação gestora do Hospital. Gerou-se um enorme déficit e, o que foi muito pior, prejudicou concretamente a população usuária do SUS, que perdeu o tão elogiado atendimento SUS de porta, 24 horas por dia, no coração da cidade e não teve outra opção senão ar incontáveis horas na espera por atendimento no Hospital Regional.
As desacertadas decisões da istração Municipal afetaram a saúde financeira do Hospital Policlínica, colocaram empregos de colaboradores em grave risco. Quem mais sofre é a população, com a precariedade generalizada na oferta de serviços de saúde, não só neste Hospital.
O cenário da saúde pública no Município de Barbacena, que acolhe usuários de 51 municípios, não é brilhante, não é divulgado pela Prefeitura como as festas promovidas pela Prefeitura. Basta pesquisar as infindáveis listas de espera por consultas e exames especializados, inclusive de alto custo, com pactuações ineficazes, sem qualquer medida concreta por parte da SESAP para fazer chegar ao usuário necessitado um serviço de saúde tempestivo, adequado e integral.
Observa-se que os recentes pronunciamentos do Município na mídia são focados quase que exclusivamente em serviços não prestados pelo Hospital, atribuindo à instituição toda a consequência do desgoverno no setor municipal de saúde, presenciado nos últimos anos.
A atuação dos gestores municipais denotam uma atuação manipuladora, atingindo a maior fraqueza de nosso povo: a necessidade de assistência à Saúde, inviabilizando um relacionamento colaborativo entre o Hospital e a SESAP, e vem minando a capacidade de nosso hospital, na tentativa de defenestrar o trabalho dedicado e competente de nossa equipe de colaboradores, com uma campanha desrespeitosa e covarde para denegrir a boa imagem do hospital.
Ninguém em sã consciência recusaria ajuda na área da Saúde para atender à população. A união de esforços do Poder Público e das entidades privadas em prol da coletividade é salutar e necessária. Lamentavelmente, isso não aconteceu com o nosso Hospital. Prefeito, Secretários de Saúde desta gestão e seus adjuntos não se interessaram em apoiar o Hospital Policlínica de Barbacena. Reuniões sucessivamente adiadas, proposições vetadas, alternativas recusadas, não por falta de esforço da Direção do Hospital. Agora, contudo, anunciam na mídia uma espécie de “força-tarefa” para recuperar a atividade do Hospital… Se hoje isso se afigura possível, maior prova não há da absoluta falta de vontade política municipal de atuar em conjunto com a Direção do Hospital, o que poderia ter sido efetivado diante de tantos pedidos de colaboração pela Direção do Hospital.
Em outubro, a Direção do Hospital apresentou um projeto para assegurar a realização das cirurgias eletivas, chamado de PROJETO MAIS CIRURGIAS, para ampliar a assistência à população, a nova gestora municipal do SUS foi postergando, se valendo de escusas vagas e imprecisas, e, de repente... veio a intervenção!
Infelizmente, alguns governantes se utilizam da intervenção istrativa de forma distorcida, distanciada dos fatos verdadeiros, obscurecidos por desculpas e argumentos pífios, que falseiam a verdade para obter dividendos políticos e reconhecimento como “salvadores da pátria”, quando verdadeiramente é o mais do mesmo: o antigo e repugnante jogo de poder, disfarçado da vontade repentina de proteger aqueles que nunca foram prioridade nas suas atuações e pretensões políticas.
E foi exatamente o que aconteceu em Barbacena: foi criada uma situação de desconstrução dos serviços, pela falta de financiamento e logística dos pacientes, de forma a justificar as críticas, as cobranças públicas, acarretando no alijamento moral e ético da instituição, com ajuda de formadores de opinião locais alinhados com o Poder, na tentativa de justificar uma intervenção permeada de excessos, sobre uma instituição que, desde a sua fundação há 84 anos, sempre foi referência de cuidados de excelência e acolhimento aos mais humildes.
Compreendemos, com imensa decepção, que a falta de ações concretas por parte da gestão municipal e os recorrentes adiamentos das questões vitais pretendiam apenas ganhar tempo, enquanto era cuidadosa e maldosamente arquitetado, a várias mãos, aquele que seria o grande golpe contra o Hospital, de nítido cunho pessoal contra a Direção do Hospital.
Depois destes esclarecimentos que buscam trazer a conhecimento dos cidadãos de Barbacena e região todo o contexto e as ações por trás desta intervenção, apresentamos nossa respeitável história de 84 anos de existência, prestando assistência à Saúde, contando com uma equipe de profissionais dedicados, competentes e compromissados com nossa missão de salvar vidas e promover a Saúde de modo ível a todos, sem exceção.
Esta intervenção em nossa instituição é um acinte a todos os que ali trabalham com dedicação, amor e carinho. Na última segunda-feira, o Interventor nomeado, a Sra. Secretária de Saúde, o Sr. Prefeito e o Sr. Secretário de Estado da Saúde protagonizaram um triste capítulo na história de Barbacena, com traços de rancor pessoal, perseguição política e elevação dos interesses particulares acima dos interesses da população.
Com gratidão, o nosso “até breve”.
Otávio Vieira
O conteúdo desta carta pode não refletir a linha editorial do portal. Carta assinada pelo Diretor geral afastado do Hospital Policlínica de Barbacena.